Começou como um dia qualquer e eu tomei café da manhã, me banhei, botei minha roupa e saí pelas ruas para chegar ao trabalho. Cumpri minhas tarefas, almocei, voltei a cumprir as tarefas e vim para casa, de novo pelas ruas. Chegando em casa eu não sabia o que sentir, parecia que tinha algo dentro de mim, maior do que eu até. E eu caí no choro, sem entender a razão. Foi uma noite difícil de dormir, mas não tinha viagem no dia seguinte, não tinha alguém querido chegando, não era o show impossível da minha banda favorita que ia rolar aquele fim de semana, não tinha sonho no café da manhã, não tinha feriado aquela semana, não tinha basicamente nada. E ainda assim eu estava tomado por esse algo que não me deixava dormir.

Foi depois que comecei a entender que não era eu, que tinha algo errado em mim. Pedi ajuda e os médicos prontamente me atenderam, disseram que eu estava ansioso. Mas todos nós temos ansiedade, não é mesmo? É natural! Faz parte de ser humano, é básico. E aí você fica nervoso com a viagem da sua vida e confere 3 vezes o checklist, as passagens, o passaporte, o cadeado, o zíper da mala, a quantidade de pares de meia, etc. Dorme mal um dia antes de se alistar para o exército. Suas mãos suam como se você tivesse acabado de lava-las e faltam 30 minutos para a prova do vestibular, mas você já está na cadeira pronto para a prova. A questão é: ansiedade é uma doença?

Aquilo tinha ido mais longe do que eu gostaria ou estava disposto a entender no momento, aceitei os remédios e tentei tocar tudo normalmente. Não fosse a primeira crise acontecer…o coração disparou e eu nem percebi. Eu não sabia o que estava sentindo e não foi choro que veio. Foi desespero. Eu oscilava entre achar que estava sentindo o que as pessoas sentem momentos antes de morrer ou que estava enlouquecendo, sem nem saber o que isso realmente quer dizer ou o que deveria. Eu sentia frio num dia quente e logo me falaram que minhas mãos estavam frias como gelo. Meus batimentos cardíacos acelerados. Eu não tinha coragem de tomar o remédio para dormir, nessa altura faziam uns 5 dias que eu não dormia direito, e não sabia mais se eu sabia dormir. Eu realmente não dormia direito, demorava a pegar no sono e acordava inúmeras vezes durante a madrugada.

Naquela noite eu vi uma médica que me garantiu que tudo estava bem e aquilo era uma crise, o pronto-socorro ao resgate. Que os efeitos colaterais da bula do remédio para dormir só ocorrem em casos raros e que eu só precisaria seguir a orientação dela para que tudo ficasse bem. Recebi um calmante e dormi, dormi como uma pedra, como um urso que hiberna, como um bom trabalhador descansa no fim da semana, como uma criança que não conhece as preocupações do mundo, como alguém que se entrega. Eu acordei achando que tinha entendido um pouco, mas ainda não sabia o que fazer em caso de crise, eu deveria realmente correr pro médico?

Mais ou menos uma semana após a primeira crise veio a segunda, naquele dia eu não havia trabalhado. Eu me sentia cansado e indisposto, nada me relaxava. No meio da tarde, depois de ver alguns seriados ela veio, o coração disparou e eu sentia cada batida. Rápida e forte. Por alguns minutos eu tentei respirar e relaxar, deitar no sofá. Não funcionou, corri novamente para os braços acolhedores dos médicos. Dessa vez eu já estava muito melhor quando vi a médica, mas suas perguntas me provocavam as mais infundadas preocupações. Perguntas como: café ou chá? Se tornam um verdadeiro calvário e você inventa todos os tipos de teoria da conspiração possíveis. Mas algo mudou depois daquela consulta. A médica me disse: ache uma válvula de escape, talvez um muay thai, correr, pedalar, etc. Depois descobri que exercícios aeróbicos são recomendados.

E foi isso, foi isso que começou a trazer algum equilíbrio para mim. Mexer o corpo e fazendo algo que eu gosto sem ter que me preocupar sobre todo o resto. Eu tentei meditar naquele momento, mas era muito mais difícil, normalmente eu observava meus pensamentos e os deixava fluir. Às vezes, tomado por emoções, mas naquele estado os pensamentos eram muito inquietos, incessantes de uma forma que ficar sentado sem fazer nada era doloroso. Simplesmente não era o momento de meditar. Achei isso muito importante, não me ater à uma válvula de escape. É um teste, eu tentei meditar, tentei treino funcional, mas não sei se natação funcionaria. Caminhadas/corridas funcionou.

As coisas estão bem melhores, eu tento colocar minhas preocupações em algum lugar para resolve-las. Uso uma matriz de decisão para isso, assim eu tenho a sensação de que sei onde as coisas estão e elas serão resolvidas. É inacreditável como podemos adiar aspectos da nossa vida sem motivo algum aparente, simplesmente criamos motivos. Acho que o mais importante foi entender que as coisas não iriam se equilibrar da noite para o dia, que não ia ser só tomar remédio e ficar bom. É uma soma de fatores, apoio e cuidados. É gradual e requer uma paciência que geralmente não se cultiva.

Quando você ainda está muito agitado ler a bula pode só aumentar suas preocupações. Minha dica aqui é: apele para o médico, pergunte o que você pode e não pode fazer, se existem ações que podem colaborar no tratamento, se você pode beber, se pode usar outros medicamentos como analgésicos. Existe material online também para ajudar, mas não deixe de procurar ajuda médica. Depois que eu comecei a sentir mais equilíbrio eu também cheguei a ver o depoimento de algumas pessoas, aos poucos, e isso me fez entender que o que eu passei é passado de alguém. Isso me deu forças para entender que é passageiro, que eu sei o que fazer num momento de crise. Isso me forneceu segurança.